26 de outubro de 2024

Aposta e dopamina: quando o prazer das apostas vira dependência

23 de outubro de 20248min128
bets
*Por Adriana Moraes

Quem nunca fez uma fezinha, seja na famosa Mega da Virada ou em outros jogos de sorte?

A emoção de ganhar, mesmo que remotamente, faz parte da experiência de muitos. No entanto, em 2024, com a explosão das apostas esportivas online, as famosas bets, surgiu um novo desafio: a linha tênue entre diversão e o perigo da dependência.

Os sites de apostas se tornaram extremamente populares, oferecendo a ilusão de ganhos rápidos e fáceis. O que muitos não percebem é que o hábito de apostar pode se transformar em um verdadeiro pesadelo.

As bets oferecem bônus de entrada, prêmios imediatos e a possibilidade de apostar em múltiplos eventos, o que reforça o comportamento de risco. Para muitos, o jogo deixa de ser entretenimento e passa a dominar suas vidas, levando ao isolamento, endividamento e, muitas vezes, à perda de controle sobre suas ações.

Apostar é uma atividade que proporciona prazer, assim como o uso de substâncias. A combinação de dinheiro, risco e excitação frequentemente gera bem-estar e euforia, além de uma sensação de poder e sucesso. Diferente dos jogos tradicionais, onde as apostas são pontuais, as plataformas de apostas esportivas estão acessíveis a qualquer hora e em qualquer lugar, intensificando o risco de jogar em excesso.

Antigamente, havia algumas barreiras, como a necessidade de ir até um local físico para apostar. Hoje, com um celular em mãos, o acesso às apostas se tornou muito fácil e, sem controle, esse comportamento pode levar à dependência e à ruína financeira.

Dopamina
As apostas esportivas podem causar dependência pela liberação de dopamina, um neurotransmissor que gera sensações de prazer e satisfação. Essa liberação ativa o sistema de recompensa do cérebro, criando um ciclo contínuo de apostas.

À medida que o cérebro se acostuma à liberação constante de dopamina proporcionada pelas apostas, o jogador começa a necessitar de estímulos mais fortes para alcançar o mesmo nível de satisfação. Isso leva a apostas mais frequentes, arriscadas e de valores mais altos, uma vez que os níveis de resultados obtidos inicialmente não são mais justificados. Esse fenômeno é conhecido como “tolerância”, e contribui para o agravamento do comportamento compulsivo.

Quando o jogador está perto de ganhar, ou efetivamente ganha, o cérebro libera grandes quantidades de dopamina, criando uma sensação intensa de euforia. Esse pico de prazer reforça a expectativa de que uma próxima aposta possa trazer uma recompensa semelhante, alimentando o ciclo de dependência e levando o jogador a ignorar as consequências negativas de suas ações.

Mídia e as apostas esportivas
Atualmente, um dos assuntos mais comentados é o impacto das apostas esportivas e de plataformas como o “Tigrinho”, amplamente divulgados pela mídia como uma ameaça à saúde mental e à estabilidade financeira.

 
A Revista Veja destaca que a dependência em jogos de azar ganhou tração com as facilidades do mundo online e, em meio à regulamentação das bets no Brasil, tem se consolidado como uma das principais preocupações de psiquiatras. Segundo a CBN, essas apostas esportivas podem se transformar em um verdadeiro pesadelo, gerando danos emocionais e financeiros. O governo também está tomando medidas a respeito, de acordo com a Agência Brasil, o Jornal Folha de S. Paulo e o G1, o Cartão do Bolsa Família será bloqueado para o pagamento de bets, conforme reforçado pelo Ministro da Fazenda. Além disso, o portal Migalhas explica o que será permitido ou não no uso dessas plataformas, enquanto o site Brasil de Fato relata que o Ministério da Saúde está intensificando ações para combater a dependência em apostas e jogos de azar online.

Ludopatia 
A ludopatia é uma condição médica caracterizada pelo desejo incontrolável de continuar jogando, mesmo diante de grandes perdas. Reconhecida pela Organização Mundial da Saúde (OMS), a ludopatia está classificada como uma doença que afeta o comportamento de forma compulsiva. A doença envolve um ciclo perigoso de apostas, em que o jogador sente uma necessidade crescente de continuar jogando para atingir o mesmo nível de excitação. Esse ciclo leva a comportamentos cada vez mais arriscados, resultando em dívidas, isolamento social e sérios problemas de saúde mental, como ansiedade, depressão e pensamentos suicidas.

Os jogos de azar e outras plataformas de apostas online, representam um dos maiores desafios de saúde mental na era digital. Com as apostas disponíveis 24 horas por dia, a compulsão se intensifica, especialmente entre os mais vulneráveis. O ambiente digital torna a recuperação mais difícil, pois o estímulo constante e a promessa de ganhos rápidos alimentam o risco da dependência.

Tratamento
Assim como em outras formas de dependência, o jogador compulsivo enfrenta uma barreira importante ao buscar ajuda. Muitas vezes, ele se sente preso em um ciclo de negação e vergonha, o que dificulta a aceitação do problema e a busca por apoio. À medida que a compulsão por apostar aumenta, o jogador se afunda cada vez mais em dívidas, criando uma dependência que parece impossível de romper.

Essa luta interna, combinada com o medo de ser julgado, leva muitos a adiar a busca por tratamento, resultando em consequências devastadoras para sua saúde financeira, emocional e social. O tratamento da ludopatia envolve acompanhamento psicológico e, em alguns casos, intervenções médicas, devendo ser abordado com a seriedade de uma condição médica real, que pode comprometer a vida do indivíduo e suas relações sociais.

Assim, a ludopatia associada às apostas esportivas online não só destrói finanças, mas também desgasta a saúde mental e emocional, exigindo uma atenção maior de profissionais e campanhas de conscientização.

*Adriana Moraes – Psicóloga da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina) – Especialista em Dependência Química e Saúde Mental – Colaboradora do site da UNIAD (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas).


Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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