23 de dezembro de 2024

A evolução do Narcotráfico no Brasil e México

7 de dezembro de 200810min40

México revive terror dos cartéis colombianos

Juan Carlos Garzón: Cientista político colombiano governos de México, Colômbia e Brasil não conseguem acompanhar o processo de globalização das máfias, diz especialista
Marcelo Beraba
No México, em 2008, os homicídios devem chegar a quase 15 mil, 23% a mais do que no ano passado e quase 30% superior a 2005. São dados do Conselho Cidadão para a Segurança Pública e Justiça que refletem a crescente onda de violência relacionada ao crime organizado, principalmente o envolvido com tráfico de drogas, e indicam que as medidas adotadas pelo presidente do México, Felipe Calderón, a partir de 2007, ainda não surtiram efeito. Embora grave, a situação da Colômbia e do Brasil, outros dois países diretamente afetados pela violência oriunda da multiplicação de organizações criminosas locais e globalizadas, não se compara à do México. Essa é a avaliação do cientista político colombiano Juan Carlos Garzón, que acaba de lançar o estudo Mafia & Co – La red criminal en México, Brasil y Colombia (Editora Planeta). Analista com pesquisas realizadas para a Organização dos Estados Americanos (OEA), Garzón compara o terror que domina hoje grandes áreas do México ao pior período da Colômbia, no início dos anos 1990, quando os cartéis de Cali e de Medellín enfrentaram abertamente as forças do governo colombiano. “A situação no México hoje é muito grave”, analisa. O estudo de Garzón nos três países conclui que as organizações criminosas estão em rápida e permanente transformação. É errado imaginá-las como funcionavam havia poucos anos, como grandes organizações hierarquizadas, com chefões absolutos, como os capos da Máfia italiana ou o colombiano Pablo Escobar (1949-1993), cabeça do cartel de Medellín. Os cartéis foram substituídos por redes de organizações criminosas que se especializam em setores da economia ilegal e que se associam. A seguir, os principais trechos da entrevista, feita por telefone.

Conheça os cartéis mexicanos responsáveis pela onda de crimes

O senhor acaba de concluir um estudo sobre a ação das organizações criminosas no México, Colômbia e Brasil. Onde a situação é mais grave em termos de violência neste momento?

A situação mais grave é a do México, porque a violência está em ascensão. A situação da Colômbia e do Brasil é grave, mas os indicadores estão estáveis. Não podemos, no entanto, confiar nessa estabilidade. No México, registram-se mais casos de violência e, por isso, as organizações estão mais visíveis. Mas na Colômbia e no Brasil há organizações igualmente poderosas. No México, em algumas zonas de disputa, a violência manifesta-se de maneira muito parecida com o que aconteceu na Colômbia no período dos cartéis, no início dos anos 1990, quando eles estavam dispostos a travar uma luta direta contra o Estado. Hoje, as organizações colombianas não estão dispostas a esse tipo de enfrentamento. Geralmente, o crime organizado responde mais rápido que os Estados. Enquanto as organizações criminosas avançam muito, os Estados demoram demasiadamente a dar respostas. Hoje temos um México com as organizações criminosas na ofensiva.

A política do presidente mexicano, Felipe Calderón, de combate ao tráfico é correta?

As medidas que estão tomando hoje são melhores do que as que se tomavam antes de Calderón, mas não são suficientes. O próprio presidente reconheceu recentemente, ao completar dois anos de governo, que não encontrou a solução para o crime organizado. Mas é um problema generalizado. Nem o Brasil nem o México ou a Colômbia encontraram uma solução para diminuir a influência das organizações criminosas.

Por que?

Na Colômbia, o nível de produção da cocaína continua estável, apesar da fumigação e da erradicação (das plantações de folha de coca). No México, é só ler as notícias publicadas para ver que a política não está tendo os resultados esperados. E, no Brasil, o problema das favelas e a influência dos comandos é um assunto que não está resolvido. A situação no Rio e em São Paulo é de uma tensa calma.

Quais as principais características do crime organizado no México, Colômbia e Brasil?

Nos três países, além de traficar drogas, que é o principal negócio, os integrantes do crime organizado negociam com outros produtos ilegais. São organizações locais que conseguem colocar seus produtos em mercados mundiais. Um terceiro elemento é que têm menos hierarquias que os antigos cartéis e se parecem mais com o que conhecemos como redes. Um quarto componente é o aparato de coerção, que são grupos armados que as organizações criminosas usam para regular e proteger as economias ilegais. Nos três países a violência é um componente essencial dessas organizações. E, para completar, diria que também nos três países essas máfias impõem uma ordem social em determinadas áreas em volta do mercado clandestino.

O senhor defende no livro que as organizações estão vivendo um período de transição. Como se caracteriza essa transição?

Os cabeças já não são tão importantes. Agora são mais importantes as relações e quem maneja essas relações, embora seja possível identificar certos cabeças. No Brasil, por exemplo, podemos identificar o “Marcola” (Marcos Willians Herbas Camacho), do PCC (sigla do Primeiro Comando da Capital, organização criminosa que atua principalmente nas prisões de São Paulo). Mas o PCC funciona como uma rede e se o Marcola morrer a rede continuará funcionando da mesma forma. Este é fator determinante para entender as organizações. Não se deve mais imaginar as organizações com grandes chefes como o poderoso chefão.

Como se define uma organização em rede?

Sob o ponto de vista da organização, são grupos que funcionam como empresas que se associam a outros grupos para explorar um negócio ilegal. Isso geralmente no mundo empresarial se conhece como holding. Não depende de um líder.

Sendo uma rede, sua influência na economia e na política é muito mais diversa e tem a capacidade de influenciar desde o nível local até o nível nacional e espalha seus tentáculos e influência a distintos espaços da sociedade. É mais fácil combater as estruturas grandes e identificáveis, como os antigos cartéis, do que combater um mundo disperso de criminalidade que, no momento em que uma de suas estruturas desaparece, consegue substituí-la rapidamente. E deve-se ter atenção para o que acontece nos cárceres. Na Colômbia, no México e no Brasil as prisões continuam sendo o lugar onde o crime opera. A única opção encontrada na Colômbia e no México é extraditar os capos para os Estados Unidos. Se em nossos países não tomarmos medidas para que o sistema penitenciário isole essas pessoas, dificilmente resolveremos os problemas dos crimes nas ruas.

Quem é:
Juan Carlos Garzón

É autor do estudo Mafia & Co – La red criminal en México, Brasil y Colombia (Editora
Planeta)

Realizou pesquisas para a Organização dos Estados Americanos (OEA)

É cientista político da Universidade Javeriana e trabalhou como pesquisador na Fundação Segurança e Democracia, em Bogotá


Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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