Cracolândia e aumento por tratamento especializado
*Por Adriana Moraes
“Para trabalhar com Dependência Química é preciso estudar sempre. É uma área com poucos recursos em termos de novas tecnologias, portanto o recurso humano é o mais importante e valioso” Psiquiatra Dr. Cláudio Jerônimo
A cracolândia nos faz lembrar uma novela com inúmeros capítulos, algo que não tem fim, mas a realidade é que nesse exato momento centenas de usuários e dependentes químicos que ficavam restritas à área da cracolândia, se espalharam pelo centro da cidade de São Paulo, formando microcracolandias, sempre com a facilidade de aquisição de qualquer droga.
Podemos descrever a cracolândia como um conjunto de problemas sociais, saúde pública, educação, habitação, crime de tráfico de drogas. Durante muitos anos os dependentes químicos estiveram próximos da Rua Helvétia, há pouco tempo haviam se mudado para a Praça Princesa Isabel, o retrato sempre parecido com traficantes e usuários entre barracas improvisadas, centenas de pessoas entre os lixos, aglomeradas em busca de drogas, de preferência o crack, droga estimulante do sistema nervoso central.
O crack é uma apresentação da cocaína para ser fumada com o propósito de produzir efeitos mais rápidos e intensos. Comparado aos usuários de cocaína, aqueles que usam crack desenvolvem um padrão de consumo mais compulsivo, têm maior probabilidade de viver ou ter vivido na rua e ao mesmo tempo, engajar-se em atividades de caráter ilegal, muitos dependentes e/ou usuários cometem assaltos em plena luz do dia, para sustentar o vício. O dependente químico tem dificuldade em conseguir desenvolver suas atividades cotidianas sem a utilização da droga, o impacto do consumo de crack sobre o usuário é extremamente devastador.
Tratamento
A dependência química é uma doença cerebral complexa, tanto na característica recidivante como no comprometimento dos aspectos cognitivos, emocionais, pessoais e sociais. Por isso, recaída e lapsos ocorrem, pois fazem parte deste transtorno e os dependentes químicos que se encontram na região da cracolândia, quando recaem, voltam para o chamado fluxo, já que muitos não têm o apoio familiar que seria fundamental nesse momento difícil. [1]
O plano de tratamento é individualizado, específico para atender as necessidades prioritárias em um primeiro momento, levando em consideração a gravidade do quadro, lembrando que o consumo de crack frequentemente implica padrões mais graves de dependência.
Segundo informações do Portal do Governo – Secretaria de Estado de Saúde de São Paulo, ocorreu um aumento nos atendimentos em dois locais próximos da Cracolândia, o CRATOD (Centro de Referência de Álcool, Tabaco e Outras Drogas) e a Unidade Recomeço Helvétia. Acompanhe os dados abaixo:
– O CRATOD tem registrado uma média de 165 pacientes por dia, contra 134 na última semana, a Secretaria da Saúde passou esses dados no último dia 14/05.
– A Unidade Helvétia recebeu uma média diária de 114 pacientes nesta semana, as ações de suporte aos pacientes como acolhimentos, banho e ações educativas também tiveram aumento de 20%. [2]
Desde 2013, sob direção do psiquiatra Dr. Marcelo Ribeiro, o CRATOD, se transformou no centro gestor das ações de saúde do Programa Recomeço, do Governo do Estado de São Paulo. Além da ampliação do atendimento ambulatorial, o serviço passou a funcionar de modo ininterrupto, interligado a uma rede de enfermarias de desintoxicação (leitos hospitalares) e de comunidades terapêuticas (acolhimento social), o que o transformou na maior unidade de atendimento de substâncias psicoativas da América Latina, este ano o Centro de Referência completa 20 anos de trabalho.
O psiquiatra Dr. Cláudio Jerônimo é o Diretor Técnico da Unidade Recomeço Helvétia, gerenciada pela SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina), que foi criada especialmente para atender os dependentes químicos nas redondezas da Cracolândia. Na Unidade, os dependentes encontram o Centro de Convivência para aqueles que estão numa fase inicial do processo, a Enfermaria de Desintoxicação para uma fase intermediária do processo de tratamento, e a Moradia Monitorada para a fase final.
Levando em consideração esses aspectos, sobre o aumento da busca por ajuda especializada, é importante destacar que a Unidade Recomeço Helvétia está diretamente relacionada ao trabalho do CRATOD. São serviços interligados em diversas fases do processo de recuperação. A intensidade do tratamento relaciona-se à gravidade da dependência, à presença de comorbidades e de prejuízos cognitivos. O morador de rua usuário de crack tem um índice ainda mais elevado de comorbidades psiquiátricas.
Mensagem do psiquiatra Dr. Cláudio Jerônimo para quem deseja atuar na área da dependência química [3]
“Para trabalhar com Dependência Química é preciso estudar sempre. É uma área com poucos recursos em termos de novas tecnologias, portanto o recurso humano é o mais importante e valioso. É preciso ainda compaixão, mais do que empatia e tratamento humanizado. O profissional que trabalha com dependência química precisa se envolver ao mesmo tempo em que mantém uma relação extremamente profissional. Isso é muito importante: é preciso se envolver, mas de forma profissional. Só o treinamento, a experiência e o autoconhecimento são capazes de formar essa habilidade. Para trabalhar com esse tema é preciso um misto de conhecimento, persistência, generosidade, compaixão e muito trabalho.”
Referências:
[1] Tratamento do uso de substâncias químicas: manual prático de intervenções e técnicas terapêuticas / organizadores Ronaldo Laranjeira, Helena Sakiyama, Maria de Fátima Padin – Porto Alegre – Artmed, 2021.
[3] https://www.uniad.org.br/noticias/outros/dr-claudio-jeronimo-uma-trajetoria-de-sucesso/
*Adriana Moraes – Psicóloga da SPDM (Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina) – Especialista em Dependência Química – Colaboradora do Site da UNIAD (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas).