28 de março de 2024

Sobre a cura gay

21 de setembro de 20176min0
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Por: Marcelo Feijó de Mello

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O que assusta inicialmente é a grande polêmica levantada pela decisão do juiz permitindo que psicólogos possam oferecer tratamentos para a reversão da homossexualidade. Apesar do magistrado dizer em sua liminar que a homossexualidade não é uma condição patológica, ele limita a proibição do Conselho Federal de Psicologia, de 1999. Sinais da polarização social existente, não só no Brasil, mas globalmente. Ao inferir que possa haver reversão da homossexualidade, supõe que esta seria errada ou anormal, como não é isto que o conhecimento mostra, está claro que tal decisão não se baseia em argumentos científicos, sim em preconceitos com motivações religiosas ou ideológicas.

É importante saber que sexo é diferente de orientação sexual e gênero. Sexo é biológico, tem a ver com os cromossomos sexuais (XX e XY) e a genitália. Aqui temos os polos macho e fêmea e muitas variações intersexuais. A orientação sexual indica por qual sexo o indivíduo tem atração, se hétero, homo ou bissexual. Identidade de gênero é a maneira como a pessoa se identifica fazendo parte, se vê como homem, mulher e aqueles que se sentem como mais de um gênero, como transgêneros ou nenhum deles. A sexualidade humana é muito mais complexa, do que a presunção de uma tal terapia de reversão.

Uma proporção significativa da população é homossexual ou bissexual, isto desde que existe algum tipo de documentação (milhares de anos). Apesar de culturas terem ou tiveram uma visão bem mais tolerante com relação a homossexualidade, houve e há muito estigma, principalmente em eras obscuras e na vigência de regimes totalitários, quando homossexuais foram perseguidos e massacrados. Muitas religiões consideravam a homossexualidade como “abominação”, condenando muitos à morte (até hoje). As leis, então derivadas da visão religiosa, viam a homossexualidade, assim como um crime. Somente a partir da Revolução Francesa, com a abolição das leis eclesiásticas, começam movimentos de descriminalização. A Medicina passa a estudar a homossexualidade a partir do século XIX, inicialmente com uma forma de tirar a questão do campo do crime. Prosperava naquela época pensamentos de que a orientação sexual tivesse um fundamento biológico, e que a homossexualidade fosse uma espécie de perversão dos instintos ou patológica.

O termo inversão sexual, criado pelo sexólogo Inglês Havelock Ellis e seu assistente (homossexual) Symmonds, dominou a literatura no começo do século XX, pensando como uma alteração ligada aos hormônios sexuais. Os estudos atuais ainda têm em parte esta visão, e mostram que a orientação sexual (todas) tem na realidade correspondentes biológicos (como todos os comportamentos humanos) e estaria ligada a várias regiões do genoma, com envolvimento epigenético (os genes sofrem influência do meio ambiente para serem ativados ou não). Não se pode dizer que existam características que definem o funcionamento cerebral de diferentes orientações sexuais, mas sim, que elas diferem entre si. Os circuitos cerebrais que determinam nossa orientação sexual são fundamentais nesta determinação. O espaço para a ação do meio ambiente na determinação da orientação sexual é bem menor. Com os conhecimentos atuais vários mitos, baseados em preconceitos, foram desbancados. Experiências homossexuais na infância não determinariam a homossexualidade, nem filhos adotivos de pais homossexuais serão homossexuais.

Com o desenvolvimento das sociedades, associado a laicização e democratização dos governos, a declaração dos direitos humanos e consequente luta pela defesa das minorias. Prevalecem decisões que possam ser de certa forma justificadas pelos vários ramos das ciências. A Psiquiatria foi, através da Associação Americana de Psiquiatria, a primeira a retirar em 1973 a homossexualidade de suas classificações de doenças mentais, desmedicalizando-a. Aqui no Brasil a Associação Brasileira de Psiquiatria foi a pioneira em 1984 neste caminho, seguida do Conselho Federal de Psicologia em 1985.

Todo este histórico nos posiciona sobre a liminar do Juiz de Brasília, que com certeza deverá ser suspensa pelo Supremo, mas que é mais um indicador de que em momentos de crise, existem riscos de retrocesso do processo evolutivo das sociedades apoiados por movimentos mais radicais ideológicos e religiosos, querendo impor seus extremismos à sociedade.

 

Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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