Álcool e pressão alta

4 de março de 20178min1
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Carta Capital

Entrevista – Maria Teresa Lourenço

por Riad Younes 
 
Dieta, sim. Exercício, também. E menos de dois drinques por dia. A hipertensão agradece
 
Divulgação

A redução no consumo de álcool diminui a pressão arterial, mas depende das doses

Que o consumo de álcool eleva a pressão arterial, isso já era do conhecimento de todos. Uma dúvida persistia na mente dos especialistas: se a redução do consumo de álcool, por sua vez, reduziria a pressão arterial.

Um estudo recentemente publicado na revista Lancet, por um time de cientistas liderado pelo doutor Michael Roerecke, do Instituto de Saúde Mental do Canadá, tentou responder a esta pergunta. Levamos a questão à doutora Maria Teresa Lourenço, chefe de Psiquiatria do AC Camargo Câncer Center e psiquiatra do Centro de Oncologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.

CartaCapital: A hipertensão (pressão alta) atinge mais de 30 milhões de brasileiros e, no País, o consumo de álcool é muito comum. Qual o impacto desses problemas na população?

Maria Teresa Lourenço: O consumo de álcool e a hipertensão estão entre os cinco primeiros fatores considerados responsáveis pelo crescimento das doenças não comunicáveis (contagiosas) e são pontos-chave para o objetivo da Organização Mundial da Saúde (OMS) de reduzir as mortes por doenças não comunicáveis em 25% para 2025.

CC: Como os cientistas do Canadá avaliaram o impacto da redução do álcool no comportamento da pressão arterial?

MTL: Para avaliar os efeitos da redução do consumo de álcool na pressão arterial, os autores selecionaram 36 trabalhos de pesquisa clínica, que envolveram um total de 2.865 participantes, sendo 2.464 do sexo masculino e 401 do sexo feminino.

CC: A redução do consumo de álcool conseguiu diminuir a pressão arterial?

MTL: O impacto do controle da bebida alcoólica depende do hábito pessoal. Os autores observaram que, nos indivíduos que consomem até dois drinques ao dia (1 drinque = 12 g de álcool; por exemplo, uma lata de cerveja tem, aproximadamente, 14 g de álcool), a redução do consumo de álcool não estava associada a uma queda significativa da pressão arterial.

Nos indivíduos que consumiam mais de dois drinques por dia, a redução do consumo de álcool, em 50% das doses, estava significativamente associada à redução da pressão arterial, sendo esse achado mais evidente naqueles indivíduos que consumiam mais de seis drinques diários.

CC: O que os pesquisadores concluíram então?

MTL: Concluíram que a redução no consumo de álcool diminui, sim, a pressão arterial, mas depende das doses. Só em indivíduos que consomem até dois drinques ao dia não haveria aumento significativo da pressão.

CC: Então, seria interessante recomendar à população em geral reduzir o consumo de álcool?

MTL: Intervenções que visem reduzir o consumo de álcool para indivíduos que tomam mais de dois drinques ao dia reduziriam, sim, as taxas de hipertensão, assim como o consumo nocivo do álcool.

CC: Qual o impacto esperado dessas ações nos níveis de hipertensão?

MTL: Para estudar o potencial efeito de uma intervenção na população para indivíduos com consumo pesado de álcool foram utilizados dados do Health Survey of England de 2014, recomendando uma redução de 50% para indivíduos com consumo superior a dois drinques ao dia.

CC: O efeito é igual nos homens e nas mulheres?

MTL: No presente estudo, o número de trabalhos encontrados envolvendo indivíduos do sexo feminino foi pequeno, o que não permitiu nenhuma conclusão para esse grupo, especificamente. Mas gostaria de lembrar que as mulheres são mais suscetíveis aos efeitos nocivos do álcool.

CC: Quais são as implicações desse estudo no Brasil?

MTL: Do ponto de vista da saúde publica, os achados do estudo sugerem que a redução do consumo de álcool e da pressão arterial atua de forma sinérgica, reduzindo a morbidade e a mortalidade da população e, consequentemente, baixando os custos com saúde.

O que fica é que, para o tratamento da hipertensão, tão importante quanto o incentivo à dieta e ao exercício físico é a redução do consumo de álcool para níveis inferiores a dois drinques diários. Os pacientes que consomem álcool de maneira abusiva devem ser orientados e a eles devemos oferecer tratamento especializado. 

 

Sobre a UNIAD

A Unidade de Pesquisa em álcool e Drogas (UNIAD) foi fundada em 1994 pelo Prof. Dr. Ronaldo Laranjeira e John Dunn, recém-chegados da Inglaterra. A criação contou, na época, com o apoio do Departamento de Psiquiatria da UNIFESP. Inicialmente (1994-1996) funcionou dentro do Complexo Hospital São Paulo, com o objetivo de atender funcionários dependentes.



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